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quinta-feira, 17 de março de 2011

Características pré-linguisticas e intencionalidade comunicativa - 1º Ano de vida


     A comunicação é considerada um processo interactivo de troca de informação entre dois ou mais interlocutores, que permite ao indivíduo partilhar experiências, ensinar e aprender. Este processo é habitualmente designado de período pré-linguístico e ocorre logo no momento de gestação até ao primeiro ano de vida. Desde o nascimento que as crianças começam a adquirir importantes bases comunicativas, através da interacção com os seus cuidadores e das experiências adquiridas durante a exploração do meio ambiente. Deste modo, as experiências interactivas, bem como as experiências com o meio é que permitem ao bebé o desenvolvimento da comunicação.
     A aquisição pré-linguística, que decorre ao longo do primeiro ano de vida, implica a aquisição de áreas fulcrais para o posterior desenvolvimento da linguagem. O 1º ano de vida é de uma importância fundamental para todo o desenvolvimento socioafectivo do bebé, ele deverá criar autoconfiança nas suas competências comunicativas e fornecer-lhe bases sólidas para o seu desenvolvimento harmonioso. É nesta fase que se adquirem importantes competências consideradas ainda pré-linguísticas, nas quais se processam importantes transições que determinam um desenvolvimento adequado, ou seja, dentro dos parâmetros considerados normais. É de referir que este período ocorre desde o nascimento ou até mesmo da gestação até ao aparecimento da primeira palavra, isto é, até ao primeiro ano de vida.
     Durante o primeiro ano de vida observa-se (para além de outras evoluções), a transição da comunicação pré-simbólica para a comunicação simbólica e da comunicação pré-intencional para a comunicação intencional. Durante o período pré-simbólico o bebé não apresenta ainda um conhecimento do simbolismo (conjunto de símbolos, que podem ser palavras ou pequenas produções vocais expressas com significado das suas necessidades) e, desta forma, não utiliza símbolos para a comunicação. Assim, para expressar as suas necessidades, ainda que de forma inconsciente e reflexa, utiliza o choro ou o sorriso. Numa fase posterior, já utiliza comunicação simbólica, o bebé é capaz de utilizar gestos e vocalizações convencionais que permitem ao cuidador compreender as suas necessidades (Wetherby et al, 1998).
     A criança vocaliza desde o nascimento, através do choro e outros sons. Se estes sinais forem ignorados, não ocorre comunicação. Por outro lado se estes sinais forem correspondidos, existe comunicação. O que significa que o papel do cuidador é fundamental para proliferar as competências comunicativas da criança e proporcionar as referidas transições. Para tal, o interlocutor pode recorrer a estratégias específicas e adaptar-se às competências da criança, de forma inconsciente (Owens, 2005). Por volta dos 2 Meses a criança já sorri, ou seja, interage na comunicação com os outros. Contudo, esta comunicação não é intencional, pois este é um comportamento reflexo. Por volta dos 9 Meses o bebé apresenta já intencionalidade de comunicar através do olhar mútuo, de gestos e sons praticados, até atingir o seu objectivo comunicativo. Assim pode-se constatar que, antes de usar as palavras a criança adquire um reportório de sons e gestos convencionais para expressar as suas intenções comunicativas, embora a produção da primeira palavra com significado ocorra por volta dos 12/13 meses. Todo este processo de comunicação intencional depende do desenvolvimento cognitivo, visto que esta intencionalidade subentende uma resolução de problemas através de pessoas e objectos.

Intencionalidade comunicativa

     Tal como já foi referido anteriormente, a intencionalidade comunicativa é uma competência pré-linguística de extrema importância para a aquisição da linguagem. A intenção comunicativa implica que o emissor tenha uma meta proposta para atingir e que haja uma consciência do efeito que o sinal comunicativo pode provocar no seu interlocutor, isto é, os autores definiram-na como a emissão de um sinal comunicativo que tem intenção de afectar o receptor da mensagem de um modo específico.
     Esta competência está vinculada ao desenvolvimento cognitivo, motor e social, isto é, o seu desenvolvimento eficaz e harmonioso depende do desenvolvimento destas três áreas. Por exemplo, para que o indivíduo apresente formas mais complexas de intencionalidade comunicativa, o indivíduo deve compreender a separação de si mesmo do ambiente, deve começar a interagir com outros, ser consciente dos seus objectos e seus usos e compreender as relações de causalidade que existem entre estes. O mesmo não significa que estes sejam considerados pré-requisitos e que sejam necessários para o desenvolvimento da intencionalidade, devem, no entanto, estar interligados para permitir ao individuo alcançar formas mais complexas de intencionalidade, tais como, elaboração de planos elaborados para alcançar uma meta (Baumgart, 2003).
     Para alguns autores, a comunicação pré-linguística engloba comportamentos com intenção e sem intenção comunicativa. Por exemplo, alguns investigadores consideram que o choro do recém-nascido tem a intenção de afectar a mãe, tendo como significado o pedido de alimentação. Este comportamento é desprovido de qualquer tipo de intencionalidade, no entanto, a mãe sobre interpreta essa intenção. Deste modo foi salientada a importância das respostas contingentes por parte da mãe, pois permite ao bebé começar a perceber que os seus comportamentos produzem uma reacção na mãe. A partir deste momento o bebé começa a realizar comportamentos com o intuito de produzir uma reacção no seu interlocutor.
     Após os 6 M, as interpretações maternais do choro incluem a vontade de querer um objecto ou interacção social. Por volta dos 9 M os bebés conseguem coordenar a sua atenção entre os objectos e o adulto, criando assim uma relação triádica. A partir deste momento, a criança é capaz de partilhar intenções ou objectivos comuns face a acontecimentos ou objectos. O contacto ocular e as vocalizações, também podem ocorrer nestes momentos interactivos do desenvolvimento da Intencionalidade Comunicativa. O olhar mútuo da criança funciona como uma intenção de quando a mãe vocaliza ou olha em direcção contrária, a criança chama solicitando o olhar desta. Bruner defende que os jogos sociais têm um papel fulcral na partilha de experiências. Este mesmo autor menciona ainda que os bebés ao realizarem repetidamente uma actividade aumentam a sua capacidade para interiorizar as regras que essa implica. Deste modo, conclui que a natureza ritualista de determinadas tarefas e a sua repetição frequente facilitam o desenvolvimento da intencionalidade comunicativa.
     Aproximadamente a partir dos 9 M, a criança imita comportamentos motores simples, nomeadamente, respondendo a pedidos motores, como dizer adeus. A criança responde verbal e não verbalmente à mãe de acordo com a idade, ou seja, quanto maior a idade, maior o número de respostas. A orientação visual entre a criança e a mãe, também pode, por volta dos 9 M, ser uma combinação entre os olhos de forma a estabelecer tópicos de proto-conversação (pequenos exemplos/protótipos de futuras conversações). Estas novas aquisições linguísticas, adquiridas pela criança, dão-lhe um reportório maior que lhe permite com maior facilidade expressar os seus desejos específicos. O cuidador também monitoriza as vocalizações do bebé entre o 8º e o 12º M e reconhece padrões de entoação proferidos pela criança que sugerem mensagens de pedidos, frustrações, agradecimentos e alegrias, contudo esta monitorização decresce à medida que a criança evolui.
    Deste modo, existem duas correntes que analisam o desenvolvimento da intencionalidade comunicativa, em que uma refere que a intencionalidade comunicativa atinge o desenvolvimento máximo no primeiro ano de vida e a outra refere que este desenvolvimento se prolonga para além dessa mesma idade.

Fases do desenvolvimento:
Por volta dos 8/9 M as crianças começam a desenvolver intencionalidade ou metas direccionadas e a capacidade para partilhar metas com os outros. A criança começa, nesta fase, a codificar mensagens. Pela primeira vez, a criança necessita de audiência e pode mesmo tocar na mãe ou puxá-la, ganhar contacto visual e procurar fazer gestos que indiquem os objectos. O uso destes sinais por parte da criança é chamado de função comunicativa e é expresso inicialmente através de gestos. Por outras palavras, funções como pedir, interagir e chamar a atenção são as primeiras formas de comunicação pré-linguística. Para utilizar estas funções, entre os 6 e os 12 M, as crianças desenvolvem em repertório vocal que lhes permitem também regular as interacções com os seus cuidadores.

Estádio Prelocutório (do nascimento da criança até à segunda metade do primeiro ano de vida (sexto mês), continuando ao longo do segundo ano de vida). Deste modo, a criança torna intencionais os seguintes sinais: chorar, rir, utilização da face que irão suportar a sua interacção com o meio. Inicialmente o comportamento da criança é caracterizado por interacções atencionais nas quais a criança tende a discriminar estímulos. Esta responde aos estímulos com comportamentos indiferenciados e difusos como por exemplo o choro, que indica normalmente dor, desconforto ou necessidades, mas não identifica necessariamente a causa do problema, a mãe interpreta o comportamento do bebé e responde diferencialmente. Os primeiros comportamentos da criança servem directamente as funções, isto é, quando a criança chora tem uma função directiva para a sua mãe, alertá-la para algum desconforto e fazê-la investigar a causa por despiste. Logo que a criança começa a fazer deliberadamente tentativas para partilhar experiências específicas com o seu cuidador, surgem interacções contingentes, onde o seu comportamento é directamente relacionado com o manter das interacções. Desta forma, os seus sinais que eram resultado de reflexos internos, como chorar tornam-se mais convencionais para uma determinada resposta a esse contexto comunicativo. No final deste estádio a criança torna-se mais interessada na manipulação de objectos, começando assim a usar gestos convencionais. Estes gestos são normalmente breves e incompletos e demonstram um conhecimento sobre o propósito do objecto, ou o seu uso funcional e incluem comportamentos como levantar o copo até aos lábios. Estes gestos constituem a forma primitiva de nomear e categorizar os objectos fazendo-os pertencer a uma classe. No final desta fase, para os objectos que não estão ao seu alcance a criança já começa a apontar.

Estádio Ilocutório (entre os oito / nove meses de vida)
Neste estádio a criança usa gestos ou vocalizações ou ambos para comunicar as suas intenções, e os seus comportamentos começam aqui a ser diferenciados através de sinais de intencionalidade. Este estádio pressupõe três sub-estádios, nos quais a criança:

1º exibe-se a si mesma. Esta fase caracteriza-se por interacções diferenciadas, onde o seu comportamento se começa a tornar coordenado e regulado na tentativa de atingir o seu objectivo de comunicação. Exemplo: levanta os braços para ser pegada ao colo, esconde a face, mostra-se tímida.
2º mostra objectos, estende-os para o seu cuidador, sem os relacionar com este. Chama a atenção através do olhar e dos gestos para estes objectos como uma forma de partilhar atenção.
3º já é capaz de demonstrar um grande grupo de gestos, incluindo formas convencionais de mostrar, dar, apontar e pedir. Outras formas de gestos não convencionais como as birras e o esconder-se também estão presentes nesta fase. De uma forma geral, a criança desenvolve o seu próprio estilo de gestos não convencionais.

Finalmente o bebé desenvolve um ou mais gestos funcionais dirigidos a um significado específico tal como: tocar na boca repetidamente com intenção de comer ou correr para a porta com a intenção de sair. Nestes gestos iniciais podemos considerar duas funções comunicativas: os protoimperativos (pedidos que a criança realiza, sinalizando a partilha de um objecto) e os protodeclarativos (permitem partilhar informação, assim como pedi-la, são o “dar”, “mostrar”, “apontar”. Neste caso usam o objecto para obter atenção do adulto).

Estádio Locutório (quando acontece a produção da primeira palavra com significado)
É nesta fase que o bebé começa a usar linguagem simbólica, passando a realizar interacções simbólicas, isto é, começa a interagir com a mãe usando meios simbólicos como os gestos e o apontar. As verbalizações convencionais usadas pelo bebé podem ser ou não acompanhadas por gestos. Por exemplo primeiro desenvolve-se o gesto de apontar, depois a vocalização aliada ao apontar e por ultimo desenvolve-se a nomeação aliada à vocalização. Deste modo, palavras e gestos são usados para referenciar o mesmo conteúdo.
Inicialmente, as mensagens são representadas inteiramente por gestos. Por volta do primeiro ano de vida, os gestos são utilizados para comunicar de uma forma mais simbólica.
O desenvolvimento da comunicação está baseado no desenvolvimento da criança normal. Assim as competências comunicativas progridem segundo duas dimensões: dimensão vertical e dimensão horizontal (função comunicativa). A dimensão vertical tem como objectivo explicar como surge a intencionalidade comunicativa. Para isso foram descritos seis níveis de intencionalidade. A análise de cada nível dá-se de acordo com o conhecimento/desconhecimento da meta – objectivo proposto pelo bebé, bem como, os planos organizados pela própria criança para atingir a mesma. Por exemplo se esta chora a razão favorável é a necessidade de alimentação, então a sua meta é comer.
Quando se processa a transição da comunicação de pré-intencional para intencional, as formas e funções das vocalizações da criança tornam-se mais variadas.

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