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quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Autismo e PEA: alguns tipos de intervenção

A maioria das famílias usa o tipo de intervenção intensiva que melhor se adequa às necessidades do seu filho e que está de acordo com a sua filosofia. As terapias intensivas aqui descritas requerem várias horas por semana a trabalhar comportamentos, metas de desenvolvimento e/ou educacionais. São desenvolvidas especificamente para intervir em indivíduos com perturbações do espectro do autismo.

Embora a investigação e a experiência tenham revelado muitos dos mistérios que cercam o espectro do autismo, este continua a ser um distúrbio complexo que afeta cada pessoa de forma diferente. No entanto, muitas crianças com autismo têm apresentado avanços consideráveis com a combinação correta de terapias. 
Cada desafio deve ser tratado com uma estratégia terapêutica adequada ao quadro particular da criança em causa. Nenhuma abordagem funciona para todas as crianças. Para além disso, o que resulta para uma criança por um período de tempo pode deixar de funcionar. Algumas terapias são apoiadas por pesquisas que mostram a sua eficácia, enquanto outras não o são. A competência, experiência e estilo do terapeuta são fundamentais para a eficácia da intervenção, mas, antes de optar por uma terapia, será necessário inteirar‑se sobre os seus pontos fortes e fracos e comparar com as demais. Também é importante consultar o seu pediatra de desenvolvimento para obter mais informações.

Intervenções intensivas, específicas para PEA, disponíveis em Portugal

a) Análise Comportamental Aplicada (ABA)

O ABA visa a aprendizagem de competências e a redução de comportamentos desafiantes, e a maioria dos programas ABA são altamente estruturados. As habilidades específicas e os comportamentos são baseados num currículo estabelecido: cada competência é dividida em pequenos passos, que são gradualmente eliminados à medida que os objetivos vão sendo atingidos. À criança são dadas repetidas oportunidades para aprender e praticar cada passo numa variedade de configurações. Cada vez que a criança atinge o resultado
desejado recebe um reforço positivo como o elogio verbal, ou qualquer outra coisa que seja altamente motivadora a criança, como uma pequena guloseima, acesso ao seu brinquedo preferido ou a uma música que adora. Os programas ABA incluem, muitas vezes, o suporte em ambiente escolar, com um terapeuta, num trabalho de um para um, para orientar a transferência sistémica de habilidades para um contexto típico. As competências são divididas em partes, para que a criança aprenda a aprender num ambiente natural. O trabalho com os pares constitui uma parte importante da intervenção.
Esta terapia envolve o ensino faseado de competências individuais, usando vários ensaios repetidos de ensino e reforço que podem ou não estar intrinsecamente relacionados com a habilidade que está a ser ensinada.
Assim, o método ABA usa três passos fundamentais: o primeiro (antecedente), um estímulo verbal ou físico, tal como um comando ou pedido, que pode vir do ambiente, de outra pessoa, ou do objeto; um segundo (comportamento resultante), que consiste na resposta ou ausência de resposta ao antecedente; e uma consequência, que depende do comportamento resultante. Esta consequência pode incluir o reforço positivo do comportamento desejado ou nenhuma reação para respostas incorretas. O sucesso é medido pela recolha de dados, observação direta e análise. Se a criança não estiver a fazer
progressos satisfatórios, são feitos os ajustes necessários.

Quem presta a terapia ABA?
Apenas um analista comportamental certificado e especializado em autismo poderá implementar e monitorizar um programa individualizado.

Como é uma sessão típica de terapia ABA?
As sessões têm geralmente a duração de duas a três horas, e consistem em curtos períodos de tempo estruturado dedicados a uma tarefa, geralmente com uma duração de três a cinco minutos. O jogo livre e as pausas são usados para o ensino acidental ou para praticar competências em novos ambientes. Numa intervenção ABA adequada e dirigida a indivíduos com autismo ou PEA, todos os aspetos da intervenção são personalizados para cada aluno: competências, necessidades, motivações, preferências e contexto familiar. Por estas razões, um programa ABA pode parecer muito diferente de aluno para aluno, e vai sendo alterado conforme as suas necessidades e a evolução.

Qual a intensidade da maioria dos programas ABA?
De 25 a 40 horas por semana. As famílias também são incentivadas a usar os princípios utilizados no seu dia a dia para que se consiga, dessa forma, uma maior consistência nas aprendizagens, uma evolução mais rápida e, sobretudo, para promover e estimular a aquisição de novas competências.

b) Modelo Precoce de Denver (ESDM)

O Modelo Precoce de Denver é indicado para crianças com autismo ou com sintomas de autismo a partir dos 12 meses de idade até à idade pré‑escolar. É uma abordagem de intervenção baseada no relacionamento que utiliza técnicas de ensino consistentes com a análise comportamental (ABA). Tem como intuito promover ganhos sociais, comunicativos,
cognitivos e de linguagem em crianças com autismo e reduzir comportamentos atípicos. O conteúdo da intervenção para cada criança é definido depois da aplicação de uma lista de verificação abrangente — currículo ESDM —, que abarca todos os domínios do desenvolvimento inicial:
competências cognitivas, de linguagem, comportamento social, imitação, competências motoras finas e grossas, autoajuda e comportamento adaptativo. 
O foco do ESDM incide sobre a atenção das crianças, promovendo a sua motivação para a interação social através de rotinas altamente agradáveis, utilizando atividades lúdicas conjuntas, desenvolvendo a comunicação não verbal e verbal, imitação, e atenção partilhada, levando‑os a interações que promovam a aprendizagem social. Com base numa pesquisa, evidenciou‑se que o ESDM era eficaz para aumentar o QI, linguagem, competências sociais e comportamento adaptativo quando aplicado, pelo menos, durante um ano.

Quem aplica o ESDM?
Pode ser aplicado por terapeutas treinados em ESDM, professores de educação especial, terapeutas da fala e outros técnicos. Os pais também podem ser treinados na aplicação de estratégias ESDM.

Qual é a intensidade da maioria dos programas ESDM?
Os programas ESDM geralmente envolvem de 20 a 25 ou mais horas por semana. As famílias são incentivadas a usar estratégias ESDM nas suas rotinas diárias.

Como é uma sessão típica de ESDM?
Pretende‑se que uma sessão de ESDM seja altamente envolvente e agradável para a criança, numa perspetiva de jogo. Algumas competências são ensinadas no chão durante um jogo interativo, enquanto outras são ensinadas na mesa, com foco em atividades mais estruturadas.
À medida que a criança vai desenvolvendo competências sociais, os colegas ou irmãos são incluídos na sessão de terapia para promover as interações com seus pares. O ESDM pode ser aplicado em casa, em contexto clínico, na creche ou no jardim de infância.

c) Floortime (DIR)
Floortime é uma técnica terapêutica baseada no modelo de relação individual desenvolvido pelo Dr. Stanley Greenspan, na década de 1980. A premissa do Floortime é que o adulto pode ajudar a criança a expandir os seus círculos de comunicação juntando‑se a esta, no seu nível de desenvolvimento, e investindo no desenvolvimento dos seus pontos fortes. O terapeuta, ou o pai ou mãe, envolve‑se com a criança seguindo os seus interesses e, a partir de um compromisso mútuo, promove na criança interações cada vez mais complexas, num processo conhecido como «abrir e fechar círculos de comunicação». A terapia é geralmente incorporada em atividades lúdicas no chão. O objetivo do Floortime é ajudar a criança a atingir seis metas de desenvolvimento que contribuem para o seu crescimento emocional e intelectual. Não se concentra nas competências linguísticas, motoras, ou cognitivas, mas aborda estas áreas dando ênfase ao desenvolvimento emocional. A intervenção é chamada Floortime porque os pais brincam no chão com a criança para a envolver e estar ao seu nível.

Quem aplica o Floortime?
Além de psicólogos, professores de educação especial ou terapeutas devidamente treinados, os pais e encarregados de educação podem ser ensinados a utilizar esta abordagem.

Como é uma sessão de terapia de Floortime?
Em Floortime, o pai, mãe ou técnico, junta‑se nas atividades da criança, segue os seus interesses e envolve a criança em interações cada vez mais complexas. Durante a integração no jardim de infância,
o Floortime pode contemplar a inclusão dos pares (colegas) com desenvolvimento típico.

Qual é a intensidade da maioria dos programas Floortime?
O Floortime é normalmente aplicado num ambiente com poucos estímulos, de duas a cinco horas por dia. As famílias são incentivadas a usar os princípios do Floortime no seu quotidiano.

d) Relationship Development Intervention (RDI)
O RDI é um sistema que pressupõe a alteração do comportamento através do reforço positivo. Foi desenvolvido pelo Dr. Steven Gutstein, na perspetiva de criar uma intervenção realizada pelos pais através do uso da inteligência dinâmica. O objetivo do RDI é melhorar,
a longo prazo, a qualidade de vida das pessoas com autismo através do desenvolvimento das suas competências sociais, capacidade de adaptação e de autoconsciência.
Os seis objetivos do RDI são:

  • emotional referencing: a capacidade de usar um sistema de feedback emocional para aprender através da experiência subjetiva dos outros.
  • coordenação social: a capacidade de observar e regular continuamente o seu próprio comportamento de forma a participar em relações espontâneas que envolvam a colaboração e a troca de emoções.
  • linguagem declarativa: a capacidade de usar a linguagem e a comunicação não verbal para expressar curiosidade, convidar os outros a interagir, partilhar perceções e sentimentos e coordenar as suas ações com outras pessoas.
  • pensamento flexível: a capacidade de rapidamente se adaptar, mudar estratégias e alterar planos, com base na mudança de circunstâncias.
  • processamento da informação relacional: a capacidade de obter significado baseado num contexto mais alargado;
  • resolver problemas que não têm respostas certas ou erradas.
  • foresight e insight: a capacidade de refletir sobre experiências passadas e antecipar cenários de forma produtiva.
O programa requer uma abordagem sistemática para trabalhar, na motivação de construção e técnicas de ensino, com foco no nível de desenvolvimento e de funcionamento da criança. As crianças começam a trabalhar com os pais numa relação de um para um e, quando estão prontos, formam uma «díade». O objetivo é integrar gradualmente mais crianças no grupo, bem como o número de configurações,
de forma a que a criança aprenda a manter relacionamentos em diferentes contextos.

Quem aplica o RDI?
Pais, professores e outros profissionais podem ser treinados para aplicar o RDI, mas os pais podem também optar por trabalhar em conjunto com um consultor certificado. Trata‑se de um método projetado para ser implementado pelos pais, que aprendem o programa através de seminários de treino, livros e outros materiais.

Como é uma sessão típica de RDI?
No RDI, o pai, mãe ou técnico segue um conjunto abrangente de etapas, e os objetivos de desenvolvimento são adequados às situações da vida quotidiana, com base em diferentes níveis ou estágios de competência. A língua falada pode ser limitada, a fim de encorajar o contacto visual e comunicação não verbal.

Qual é a intensidade da maioria dos programas de RDI?
As famílias usam os princípios da RDI no seu dia a dia. Cada família terá de fazer escolhas baseadas na sua organização familiar.

e) TEACCH

O TEACCH é um programa de educação especial desenvolvido no início de 1970 por Eric Schopler e os seus colegas da Universidade da Carolina do Norte. A intervenção da abordagem TEACCH é chamada de «ensino estruturado». O ensino estruturado é baseado no que o TEACCH chama de «cultura do autismo». A cultura do autismo refere‑se aos pontos fortes e às dificuldades partilhadas por pessoas com autismo, as quais são relevantes para que eles aprendam.
O ensino estruturado destina‑se a capitalizar os pontos fortes da criança e preferências no que toca ao processamento de informações visuais, tendo em conta as dificuldades reconhecidas. As crianças com autismo são avaliadas a fim de serem identificadas as suas competências emergentes, e o trabalho centra‑se nestas habilidades. Nesta abordagem é desenvolvido um plano individualizado para cada aluno, que pretende criar um ambiente altamente estruturado. No ambiente físico e social são utilizados suportes visuais para seja criança consiga prever e compreender mais facilmente as suas rotinas e responder
a elas de forma apropriada. Os suportes visuais também são usados nas tarefas individuais para as tornar mais compreensíveis.

Qual a aplicação do TEACCH?
Os programas TEACCH são geralmente conduzidos numa sala de aula. Porém, os pais podem assumir o papel de «coterapeutas», aplicando o método em casa e trabalhando conjunta e articuladamente com a escola.

Quem aplica TEACCH?
Os professores de educação especial, terapeutas da fala e outros técnicos treinados neste modelo. As salas de ensino estruturado nas unidades de referência para alunos com diagnóstico do espectro do autismo, e que existem nas várias escolas do país, também são organizadas segundo esta metodologia.

f ) Programa Son‑Rise
O programa Son‑Rise surgiu nos EUA da década de 1970 e foi aplicado, pela primeira vez, por Bears e Samahria Kaufman ao seu filho, Raun Kaufman, diagnosticado à altura com autismo severo.
Desde 1983 que o Autism Treatment Center of America, fundado pelo casal, se instituiu para treinar profissionais e pais de crianças com perturbações do espectro do autismo, perturbações invasivas do desenvolvimento e outras dificuldades.

Quais são os princípios do programa Son‑Rise?
O programa Son‑Rise defende que os fatores mais importantes no desenvolvimento da criança são o respeito e carinho e que a motivação é essencial em qualquer processo de aprendizagem.
Entre os seus princípios contam‑se:

  • que a motivação e não a repetição são as chaves para a aprendizagem;
  • o juntar‑se aos comportamentos repetitivos da criança fornece a chave para desvendar o mistério desses mesmos comportamentos, facilitando o contacto ocular, o desenvolvimento social e a inclusão de outros nos jogos e brincadeiras;
  • o ensino através da brincadeira interativa;
  • o uso de energia, emoção e entusiasmo (a que chama os 3 E) para envolver a criança e inspirar a interação;
  • a adoção de uma atitude otimista e de não julgamento (imparcial);
  • que os pais são o recurso mais importante da criança e fornecem um foco consistente e convincente para a sua formação, educação e inspiração;
  • a criação de um ambiente seguro e livre de distrações facilita o ambiente ideal para a aprendizagem e crescimento.
g) Dieta isenta de glúten e caseína (GFCF)

Muitas famílias de pessoas com autismo demonstram interesse em intervenções alimentares e nutricionais, argumentando que a remoção do glúten (uma proteína encontrada na cevada, centeio, trigo e aveia) e da caseína (encontrada em produtos lácteos) poderá ajudar na redução de alguns dos sintomas em pessoas com autismo.
A teoria por detrás desta dieta é que estas proteínas são absorvidas de forma diferente por algumas crianças. As crianças que beneficiam deste tipo de dieta experimentam sintomas físicos e comportamentais quando consomem glúten ou caseína que são diferentes de uma
simples reação alérgica (agitação, desconforto, etc.). Por enquanto não existem estudos científicos suficientes para suportar a sua eficácia, contudo muitas famílias afirmam que a eliminação do glúten e da caseína contribui para regular a função intestinal, o sono, aumentar a diversidade de alimentos aceite pela criança ou o seu comportamento. Porque não existem testes laboratoriais eficazes que indiquem que estas crianças possam beneficiar de uma intervenção deste género, muitas famílias escolhem experimentá‑la. Porém, se efetivamente optar por mudança, deve assegurar‑se que o seu filho vai ter uma nutrição adequada, consultando o pediatra e um nutricionista.
Apesar de os produtos lácteos serem a fonte mais comum de cálcio e vitamina D, estes podem ser encontrados noutros alimentos, e o mesmo se aplica às proteínas. As fontes alternativas destes nutrientes requerem a substituição por outro tipo de fontes e especial atenção para os conteúdos nutricionais. A substituição por produtos
isentos de glúten requer alguma atenção sobre as quantidades de fibras e vitaminas numa alimentação para crianças e a suplementação de vitaminas poderá ter benefícios, mas também efeitos secundários.
Para a aplicação correta da dieta isenta de glúten e caseína será necessário o acompanhamento de um nutricionista, especialmente para as crianças que são seletivas com alguns alimentos.

Fonte: Perturbação do Espectro do Autismo: E agora? — Guia para as famílias após o diagnóstico, 2014 (DAR RESPOSTA – Associação)
Depósito legal: http://www.slideshare.net/saramartins1291/perturbao-do-espectro-do-autismo-e-agora-guia-para-as-familias-apos-o-diagnostico#btnPrevious 

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