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quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Perturbações da relação e da comunicação

Os esforços realizados ao nível do diagnóstico precoce, bem como o aumento da preocupação por parte das famílias e profissionais, tornaram evidente a insuficiência e inadequação dos modelos terapêuticos das perturbações do espectro autista já existentes, quando aplicados ao tratamentode crianças pequenas, e fizeram sentir a necessidade de desenvolver novos programas de intervenção adaptados aos problemas e necessidades específicos desta faixa etária (Charman & Baird, 2002).


O MODELO D.I.R.

O modelo D.I.R. (Modelo baseado no Desenvolvimento, nas Diferenças Individuais e na Relação) é um modelo de intervenção que tem vindo a ser desenvolvido, com a obtenção de resultados encorajadores, pelo Interdisciplinary Council on Developmental and Learning Disorders (ICDL, 2000), dirigido por Stanley Greenspan e Serena Wieder, nos EUA.
É um modelo de intervenção intensiva e global, que associa a abordagem Floor-time com o envolvimento e participação da família, com diferentes especialidades terapêuticas (integração sensorial, terapia da fala) e a articulação e integração nas estruturas educacionais.

Abordagem Floortime

A abordagem Floor-time é um modo de intervenção interactiva não dirigida, que tem como objectivo envolver a criança numa relação afectiva.
Os seus princípios básicos são:

  • Seguir a actividade da criança;
  • Entrar na sua actividade e apoiar as suas intenções, tendo sempre em conta as diferenças individuais e os estádios do desenvolvimento emocional da criança;
  • Através da nossa própria expressão afectiva e das nossas acções, levar a criança a envolver-se e a interagir connosco;
  • Abrir e fechar ciclos de comunicação (comunicação recíproca), utilizando estratégias como o «jogo obstrutivo»;
  • Alargar a gama de experiências interactivas da criança através do jogo;
  • Alargar a gama de competências motoras e de processamento sensorial;
  • Adaptar as intervenções às diferenças individuais de processamento auditivo e visuo-espacial, planeamento motor e modulação sensorial.
  • Tentar mobilizar em simultâneo os seis níveis funcionais de desenvolvimento emocional (atenção, envolvimento, reciprocidade, comunicação, utilização de sequências de ideias e pensamento lógico emocional) (Greenspan, 1992b; Greenspan & Wieder, 1998).



Terapia da Fala


A Terapia da Fala com crianças com Perturbação da Comunicação e da Relação tem que ser sensível às dificuldades específicas da perturbaçãoe às diferenças individuais de cada criança. Isto pressupõe uma avaliação cuidada e muito mais abrangente do que com outras patologias, uma vez que estas crianças apresentam graves alterações não só de linguagem, mas de comunicação, nomeadamente da comunicação não-verbal.
Estas dificuldades são evidentes quer ao nível da compreensão – no processamento da informação verbal e não-verbal, quer ao nível da expressão – na utilização do gesto natural, do gesto codificado e da palavra para entrar em comunicação com o outro.
Torna-se assim fácil de perceber que as formas comunicativas mais usadas por estas crianças são formas pré-simbólicas não convencionais (movimento global do corpo, grito, manipulação).
Estas formas servem um leque muito restrito de intenções comunicativas. As crianças usam a comunicação quase exclusivamente para pedir objectos, pedir acções e rejeitar, ou seja, para a categoria pragmática de Regular o Comportamento do Outro, mas não para as categorias pragmáticas de Interacção Social – chamar a atenção para si – e de Atenção Conjunta – orientar a atenção do outro para objectos e acontecimentos interessantes, com o propósito de partilhar a experiência com essa pessoa (Wetherby & Prutting, 1984).

A Terapia da Fala tem, assim, como objectivo fornecer à criança instrumentos convencionais de comunicação, pré-simbólicos e simbólicos, alargando as suas intenções comunicativas às categorias pragmáticas não utilizadas. Pretende-se que a criança comece a usar gestos naturais como a alternância do olhar, o apontar (proto-imperativo para a intenção comunicativa de Pedir e proto-declarativo para a Atenção Conjunta), a expressão facial, o acenar com a mão e com a cabeça, o beijar e abraçar, como formas comunicativas pré-simbólicas convencionais. Como objectivo último, pretende-se que a criança venha a utilizar formas comunicativas simbólicas: a palavra, o gesto codificado e o símbolo codificado. Para isso, é utilizado como principal estratégia de intervenção o Programa de Linguagem do Vocabulário Makaton, desenvolvido por Margareth Walker nos anos 70, que pressupõe a utilização de gestos (retirados da Língua Gestual Portuguesa) e símbolos a acompanhar a fala. A Terapeuta da Fala, os pais e os outros interlocutores são liderados pela modalidade preferida pela criança, fornecendo-lhe estrutura e consistência nas interacções comunicativas em todos os contextos. Nas crianças que apresentam uma linguagem emergente com poucas palavras altamente funcionais, este programa também é utilizado, pois fornece um meio de aumentar o vocabulário e de iniciar a construção de frases.

Nas crianças verbais, a intervenção da Terapeuta da Fala incide no desenvolvimento da compreensão e da expressão verbal, essencialmente nas suas vertentes Semântica e Pragmática, áreas sempre em défice. Também com as crianças verbais a comunicação não verbal é trabalhada em simultâneo.
Pretende-se que estas crianças desenvolvam progressivamente uma motivação para comunicar, através de formas comunicativas facilmente compreensíveis pelo outro, abram e fechem cada vez mais ciclos de comunicação com os diferentes interlocutores, o que se vai traduzir numa maior autonomia, funcionalidade e independência.
Para atingir estes objectivos utilizam-se algumas estratégias:
  • Introdução de uma terceira pessoa na sessão, para servir de modelo de comunicação;
  • Partir dos interesses individuais de cada criança (personalização da linguagem);
  • Dar intencionalidade e significação a todo e qualquer sinal comunicativo;
  • Criar situações facilitadoras da utilização funcional da comunicação/linguagem em diferentes contextos;
  • Utilização de suportes visuais à oralidade: Gesto natural, objectos, fotografias, imagens, etc.;
  • Utilização de comunicação aumentativa, nomeadamente do Programa de Linguagem do Vocabulário MAKATON, gesto codificado e símbolos gráficos, em simultâneo com a fala;
  • Redução da complexidade da linguagem pelo terapeuta.
  • Adaptação às competências linguísticas da criança (nível da palavra isolada, duas palavras, três ou mais palavras);
  • Ênfase na entoação, ritmo e melodia (Prosódia);
  • Ênfase na expressão facial e mímica corporal.
Programa clínico para o tratamento das perturbações da relação e da comunicação, baseado no Modelo D.I.R.

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